POrta do mar
“Porta do Mar” apresenta um novo recorte sobre o trabalho autoral do artista que esboça uma forte crítica social – em meio ao mar, milhares de sardinhas, gaivotas e humanos disputam seu lugar ao sol e lutam pela sobrevivência da espécie. Há em suas fotografias uma vontade neo-barroca e muito purista (duelo de sombras e luzes, texturas), além de um notável senso de coletividade: pedras que empilhadas formam casas, pássaros que em revoada se tornam nuvens, peixes que emaranhados nas redes geram cardumes que cintilam a céu aberto. Nesse contexto quase onírico, o mar regressa ao seu significado mais ancestral, o de síntese da vida.
Capturada nos rincões de uma Portugal menos óbvia do que a dos carnets du voyage, de enseadas pesqueiras acinzentadas como a Costa da Caparica às aldeias mais inóspitas, como Piódão, a série Porta do Mar é também uma janela para um mundo novo sob o olhar, que apresenta um recorte extremamente maduro das relações humanas. Mais do que uma expressão da sensibilidade, é um convite à reflexão em temas abertos que questionam valores e condutas sociais numa época em que as pessoas parecem quase lobotomizadas pela cultura do egocentrismo, da exploração da celebridade e da febre da selfie.
Ao refazer o caminho reverso da colonização portuguesa no Brasil, Luiz aborda a imensidão e a fúria do oceano, desde as arrebentações bravas de Nazaré que evocam as naus lusitanas singrando o Atlântico, até a simplicidade do indivíduo penitente no fardo da pesca, abastecendo famílias inteiras com as sardinhas que saltam abundantes de suas redes; da velha senhora escalando a viela do longínquo casario de pedra cravado na montanha, a outras situações que denunciam o isolamento de uma pequena comunidade lutando pela sobrevivência, sob a envergadura das gaivotas marginais que disputam com eles o peixe de cada dia. Fragmentos severos de um tempo que não para. Nem ali, nem em qualquer megalópole de qualquer continente. Luiz Moreira nos abre domus, portas e janelas que, invariavelmente, desembocam dentro de nós mesmos.